A discussão do legado das políticas públicas para as mulheres, juventude e em prol da igualdade racial integrou nesta quarta-feira (4) o ciclo de Debates sobre a democracia promovido pela Comissão de Direitos Humanos (CDH), por iniciativa do seu presidente, senador Paulo Paim (PT-RS). Representantes de diversos movimentos sociais revelaram o temor de perder direitos conquistados nos últimos anos. Vários afirmaram o compromisso de resistir nas ruas contra o impedimento da presidente Dilma Rousseff, que consideram um golpe contra o processo democrático.

— O Brasil pode até esquecer a gente, mas a gente não esquece o Brasil, não. A gente vai continuar a lutar. Tempos duros nos aguardam, mas mais dura vai ser a nossa resistência — prevê Flávio Renegado, cantor de Belo Horizonte, que avalia como retrocesso o atual cenário político brasileiro.

Iago Montalvão, presidente em exercício da União Nacional dos Estudantes (UNE), informou que a universidade tem sido um centro de luta em defesa da democracia. Segundo ele há comitês organizados pelos alunos e a promoção de atos contra o impeachment em todo o país.

Inclusão

Os participantes do debate apontaram o que classificam como natureza “intolerante, racista e preconceituosa” dos articuladores do impeachment para destacar que, antes do governo do PT, a população negra, jovem e pobre era praticamente “invisível”. A inclusão social, o acesso à educação e outros avanços foram citados para justificar a posição a favor do mandato de Dilma Rousseff.

— Estamos tendo pela primeira vez acesso à dignidade e à cidadania. Pela primeira vez um agricultor familiar pode estar dentro de um banco pedindo um crédito. Esse é um golpe recheado de um profundo ódio de classe afirmou Auri Junior, da Federação de Agricultura Familiar (Fetraf) do Ceará.

Na opinião de Tamara Naiz, representante da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), a democracia é a condição principal para a existência da entidade, que reúne pesquisadores e cientistas brasileiros. Contrária ao impeachment, ela reclama uma “resposta contundente da sociedade brasileira” aos arquitetos do impeachment.

— Eles querem privilégios, nós lutamos por direitos e isso nos diferencia muito — avaliou.

— O objetivo não é somente tirar a presidente, mas acabar com todas as conquistas sociais que obtivemos nos últimos anos — completou Jeferson Lima, secretário nacional da Juventude.

Projeto Conservador

Dediane Souza, conselheira da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) alertou para o “projeto conservador” em curso no país com predomínio da homofobia, que leva à violência. Foram mais de 50 pessoas vítimas este ano.

— Não nos é dado acesso aos direitos básicos e fundamentais. Eles querem fazer um processo de higienização social, com o fundamentalismo religioso. Querem nos criminalizar e encarcerar mais, não respeitam a nossa identidade de gênero. O que está em jogo não é apenas o mandato da presidente da República, somos nós que vamos sofrer — lamentou.

É o mesmo pensamento de Rúbia Nascimento, da Pastoral da Juventude do Meio Popular, que denunciou a censura da discussão sobre sexo, política e religião nas escolas, para “calar os professores”.

Já a representante da União Brasileira de Mulheres (UBM), Maria das Neves, reafirmou a esperança no atual governo que, segundo ela, “tem mudado a vida das mulheres e da juventude”.

— O golpe em curso é machista é misógino, atua contra mulher brasileira, contra o povo brasileiro, contra os trabalhadores e trabalhadoras — disse.

Críticas

Também houve críticas ao governo por ter se afastado dos movimentos sociais ao longo do tempo. Samuel Werneck, da Pastoral da Juventude, e Délio Alves,representante dos povos indígenas lembraram o prejuízo das “alianças equivocadas” com determinados grupos políticos, grandes empresas, o agronegócio e de projetos como Belo Monte.

— Para nós, povos indígenas, a democracia se resume ao direito à terra. Para a gente continuar a viver nossa cultura e tradições. Mais do que ninguém sabemos o que é opressão e violência, porque estamos há mais de 500 anos lutando e sobrevivendo — ressaltou Délio.

Democracia

Para Daniel Souza, presidente do Conselho Nacional de Juventude, o processo de redemocratização do país ainda não alcançou a sua plenitude. Ele apontou o pequeno número de deputados federais eleitos pelo número de votos que obtiveram em relação à expressiva maioria com mandato garantido apenas por coeficiente eleitoral.

Ao citar as várias acusações na Justiça contra Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, Daniel afirmou o que o pedido de impeachment foi feito por “moralistas sem moral”, que querem cassar o mandato de uma presidente eleita democraticamente, “sem crime algum”.

— Quem escolhe a presidente, a soberania popular ou o mercado? Quem é que denuncia os limites da democracia? Nós, mulheres, jovens, negros, pobres. Precisamos ocupar os espaços de poder e radicalizar, garantir a democracia para ir além dela.

 

Fonte: Agência Senado